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sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

continuação 6

SAIDINHO...



No fim da tarde convidei-o para voltar à noite para jantarmos juntos. Com um sorriso irônico no canto dos lábios ele respondeu que mais tarde voltaria.

Preparei um macarrão com molho de ervas e uma saladinha verde. Arrumei a mesa com uma toalha branca e umas flores para dar um charme. Perfumei a casa com um maravilhoso incenso de lavanda e fui me aprontar para esperar meu convidado.

Às oito horas em ponto ouvi o Zeus latir. Fui até a porta e lá estava o meu amor, lindo, com uma roupa preta e uma jaqueta de couro, dessas que motoqueiro usa.

E o perfume? O quê era aquele perfume? Não sei se aquele perfume ainda é fabricado, mais ainda hoje me lembro daquele cheiro, imponente, másculo, com um suave toque amadeirado que o tornava ainda mais atraente.

E o saidinho trazia ainda uma mochila a tiracolo com roupas de dormir. Onde foi que no convite para jantar estava escrito que depois o jantar se estenderia até o café da manhã?

Bem, mais como sou uma anfitriã educadíssima não quis envergonhar meu convidado e deixei aquela mochila passar despercebida, afinal talvez mais tarde ela pudesse ser útil.

Ele disse-me que havia trazido um CD da Alanis Morissetti e foi até o som para colocá-lo, enquanto me contava uma história de seu passatempo preferido: jogo de vôlei. E enquanto ele falava sua voz ia sumindo nos meus ouvidos e meu cérebro concentrou-se inteiramente nos seus lábios molhados que me fazia sonhar e desejar ardentemente seus beijos. Fui até ele e num rompante o beijei fundo e calmo até sua alma se sentir beijada, como diz uma canção que ouvi uma vez.

O jantar ficou pra mais tarde, depois daquele beijo vieram outros e mais outros cada vez mais ardentes e acompanhados de abraços, afagos, múrmuros e acabamos fazendo amor ali mesmo no tapete da sala. E foi tão maravilhoso, especial e fervoroso. Meu corpo encaixava no dele como um quebra-cabeça encaixa suas peças e nos completávamos de tal forma que parecia que líamos os pensamentos um do outro.

Descobrimos, com o tempo, muita coisa em comum, mas na hora do amor, decididamente era em que mais combinávamos.

Passamos aquela semana inteira juntos como numa lua de mel sem casamento. Riam, mais foi maravilhoso.



 MANHÃ

Durante todos os dia da minha vida lá no Cera a pior parte era ter que acordar cedo todas as manhãs. O despertador tocava desesperadamente e a gente ainda perdia à hora. E saia correndo, se arrumando pelo caminho, penteando os cabelos dentro do ônibus.

Teve uma vez que eu e a Andréia saímos correndo, atrasadas e para completar nos deparamos com o trem fazendo manobras nos trilhos. Ai a gente tinha duas opções: esperar o trem terminar a manobra e perder o ônibus ou então pular por entre os vagões.

O trem fazia uma parada curta entre uma manobra e a outra e essa era a chance, porém se errasse o cálculo, pulo já era. Virava presunto. A nossa sorte é que eramos adolescentes e os jovens têm uma destreza surpreendente, por que se fosse nos dias atuais, seguramente eu iria perder o ônibus.

quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Continuação 3: CAMPOS E MATOS


A COBRA

Nós estávamos escalados na topografia e fomos medir uma área na beira de um carrego porque a escola queria aumentar uns tanques de peixes e aquele terreno era apropriado para se aproveitar água do carrego usando a força da gravidade para encher os tanques.
Passamos lá uma manhã inteira, medindo, fazendo cálculos, anotando dados.
Eu, pra ser sincera, não entendia nada daquela parafernália e muito menos dos cálculos, então só segurava a régua, carregava água e os materiais para os meninos fazerem o resto. Era a ajudante.
Depois de uma manhã inteira e muito cálculo, mais um monte de “sei lá o quê” que os meninos faziam com aquele aparelho, voltamos para a escola.
Era uma segunda-feira e esse dia da semana era o mais critico. Por que cada menino quer contar mais histórias que o outro e geralmente são sobre suas peripécias do domingo à noite. As meninas da cidade davam o maior mole para os meninos do Cera e isso os fazia acreditar verdadeiramente em seus poderes de sedução.
E eles vinham numa conversa acirrada sobre seus feitos. Com o saco cheio deles comecei a andar mais rápido, pois a fome apertava. Fui me distanciando deles. Trazia nas costas o aparelho de topografia e os meninos traziam as demais ferramentas. Eu estava com fome e por isso andava rápido e com a cabeça baixa, prestando atenção na grama verde, De repente parei mecanicamente, parecia travada, possuída pelo medo, sem conseguir nenhuma reação, minhas pernas pareciam não obedecer a ordens automáticas do meu cérebro.
O Hernane, astucioso percebeu quando parei de súbito e apresou-se em minha direção, trazia nas mãos uma estrovenga e de súbito decepou ao meio, a cobra que já vinha em minha direção. Perto dali o ninho das cobrinhas, e a cobra mãe foi decepada ao tentar defender seus filhotinhos. Por certo ela acreditava que eu fosse atacá-los e veio, corajosamente, defender os filhotinhos e se não fosse meu parceiro velho de guerra há essa hora eu não estaria aqui pra escrever essa história.
Os meninos praticamente arrastaram- me até a escola, pois fiquei em estado de choque. Sentaram-me na escada do corredor e trouxeram-me um copo com água. Fiquei um pouco ali sentada, sem reação, mas logo foi voltando a circular meu sangue pelas veias e consegui andar até o alojamento para tomar um bom banho e refazer do susto.


NA CIDADE

Na cidade, sempre através de algum amigo da escola, conhecíamos pessoas que não faziam parte do mundo agropecuário que eram visinhos, amigos, primos e às vezes até paquera de alguém da escola e acabávamos nos tornando num grande círculo de amigos.
Sinara namorava com um rapaz chamado Cleber. E foi através deste namoro que nos conhecemos.
Ela convidou-me para ir a uma festa junina no quartel com ela e seu namorado.
Estava uma noite muito, muito fria. E apesar do frio e da neblina, podia-se ver, vez ou outra, a lua, tão linda e redonda brilhando no céu Aquidauanense.
Fomos as duas encontrar com o Cleber no Bar da Praça.
− Olha lá ele!
Disse a Sinara.
Olhei, mais via várias pessoas, então perguntei:
─ Qual?
─ Aquele de camiseta vermelha, agora vindo em nossa direção.
Ao vê-lo pensei: “Meu Deus do céu!” Não acreditei em que viam meus olhos, só podia ser aparição ou sonho, por certo não existia na verdade, um homem tão bonito.
Era o Homem mais bonito que já vi durante a minha vida toda. E mesmo que eu passe horas descrevendo-o, não conseguiria descrever tamanha beleza.
Eu sei que vocês vão dizer que pequei. E confesso: cobicei o homem da próxima, e a próxima estava próxima. O que é ainda pior. Mais era algo além de minhas forças e deixar de cobiçá-lo era quase impossível.
Ele andava calmamente, passo a passo pela calçada, parecia um modelo numa passarela. Usava uma camiseta Pólo vermelha calça Jeans e tênis. Cabelos bem curtinhos, estilo militar, pois ele estava servindo ao exército na época. Olhos cor de mel, pele clara, lisa, barba feita e a boca carnuda. E que “boca” era aquela? Ele tinha um jeito de ficar molhando os lábios a toda momento que era coisa de louco... E o sorriso? Um sorriso calmo, quase silencioso que parecia iluminar toda a noite. O corpo musculoso, torneado, formas perfeitas. Tudo era proporcionalmente perfeito. Cada centímetro foi desenhado com sucesso pra provar que Deus é perfeito em suas obras.
Cleber e eu conversamos a noite toda, nossos assuntos combinavam e a Sinara e o Murilo ficavam apenas nos olhando, como se fossem meros coadjuvantes no espetáculo onde nós dois atuávamos como atores principais.
Divertimo-nos muito. Riamos de tudo. É impressionante como adolescente acha graça em tudo. Também a vida é boa, sem responsabilidades, sem contas para pagar, filhos, trabalho, casa e todo o resto que faz um adulto quase enlouquecer. Mais não a nós, com nossa adolescência toda pela frente pra poder vivermos felizes e rindo de tudo. No final da festa o Cleber e um amigo dele nos levaram pra casa.
Encontramo-nos mais algumas vezes depois, sempre em companhia da Sinara, mais o namoro não durou muito, nem me lembro por que eles romperam. Sei que logo ela arrumou outro e ele outra e seguiram seus rumos na vida.
E o Cleber e eu acabamos perdendo o contato. Chegamos a nos encontrar umas vezes por acaso, mas logo ele começou a namorar outra garota e seguiu um caminho diferente do que eu e as pessoas do meu círculo de amizade costumávamos seguir.
Teste de fidelidade
Teste de fidelidade

por: Jane Matos Pereira
"Quando somos jovens fazemos umas coisas que mesmo depois de muito tempo e de mui..."

  

Continuação 5

O TEATRO




Depois de meses de ensaio chegou o grande dia da estreia da peça “Alegria” que contava um pouco da história de Rubens Correia, que nasceu em Aquidauana e também fez sucesso no teatro carioca. A peça é formada por recortes, vivências, entrevistas e fragmentos de peças vividas por Rubens Correia, um aquidauanense que foi para o Rio de Janeiro estudar e tornou-se um ator que ficou consagrado através do grupo de teatro Tablado.

A peça foi escrita e dirigida pelo professor Paulo Correia primo em primeiro grau de Rubens.

Eu e alguns amigos, que também faziam parte do grupo teatral do Cera, estávamos em minha casa, esperando o grande momento da estreia da peça.

Levei um susto ao ver o Cleber chegando, afinal o convite não era pra ser aceito, era só por educação. Na verdade, aquele dia eu queria apenas ficar concentrando para a apresentação de mais tarde.

Mais lá estava ele para a visita e para a conversa.

− Olá! Tudo bem com você, Cleber? Senta aqui e toma um tereré com a gente.

Mais uma vez, na tentativa de me livrar dele, fiz outro convite, dei a ele um convite para a estreia da peça que seria logo mais a noite. E logicamente ele foi.

A peça seria apresentada no teatro do CEUA, onde posteriormente fiz meu curso superior.

Quando cheguei ao teatro ele já estava lá me esperando, conversamos por alguns momentos e entrei para fazer a maquiagem.

Muito nervosismo, apreensão, ansiedade.

Contudo a peça foi um sucesso e tudo ocorreu como deveria.

Depois de muitos aplausos, saímos do palco, tiramos a maquiagem, arrumamos tudo e fomos pra minha casa comemorar o sucesso da estreia.

Bebemos muito e conversamos até raiar o sol.



CONVERSAS



Por falar em conversar até raiar o sol lembrei-me de uma coisa que é muito interessante e peculiar a qualquer agriculino que se preze. As gírias.

Tinham coisas bem originais. Como por exemplo, quando queríamos desconversar de algum assunto dizíamos: “quati que ti quer” ou quando concordávamos muito com uma coisa intensificávamos o “é verdade” ou contraditoriamente “pior” que era uma forma de concordar com uma coisa que não era boa.

E tinha umas frases que eu nem sei por que falávamos como, por exemplo, “cai na água capivara baleada”, “anta paralítica”, “pilungo”. E quando íamos trabalhar dizíamos “quebrar rola”.

Os “alunos recém chegados à escola eram “bagaços” e depois a cada ano era promovido para “tio” “avô” e por último “bisavô”.

E pra dar ainda uma autenticidade maior ao falatório tínhamos um sotaque caipirês bem caprichado pra acompanhar a conversa.



BAILE DO RADIALISTA



Na outra semana foi o baile do radialista, tradicional em Aquidauana. Vinha grupos musicais muito bons tocar de graça a noite inteira para o povo se acabar de dançar.

No finzinho da tarde, meus amigos da escola agrícola começaram a chegar a minha casa para os preliminares da festa. E era uma cervejinha, um petisco, tereré e muita conversa fiada até a hora de se preparar: banho, perfume, cabelo, roupa e um toque especial, que era lustrar bem a bota, e pronto, era só cair na noite.

Fomos todos juntos, mais foi só começar o baile que cada um se arranjou e eu fiquei sozinha, conversando com alguém aqui, com outro ali e a festa seguia. O bailão estava lotado, muita gente bonita e animada.

Dancei tanto que as pernas até doeram, transpirava as bicas, com o calorão que faz em outubro, fui buscar uma cerveja no bar para refrescar-me, enquanto me dirigia ao bar senti que alguém segurou meu braço, no entanto, pensei ser um dos meninos e puxei o braço num rompante, mas não era. Era ele, o Cleber em carne e osso, mais lindo do que nunca. Sorri-lhe e disse:

─ Desculpa, achei que fosse um dos meninos que vieram comigo.

E ele só sorria, não respondeu nada, ficou apenas me olhando e rindo. E aquele sorriso, valha-me Deus! Era o sorriso mais encantador, puro e verdadeiro que parecia inundar de luz a penumbra daquele ambiente. E tentativa de acabar com aquele silencio que nos consome e faz pensar um milhão de possibilidades absurdas, convidei-o para buscar uma cerveja no bar.

Aquele percurso até o bar pareceu alongar-se demasiado e que para chegar levamos horas.

Eu achava-o o homem mais lindo e fascinante de todo o mundo e nem nos meus melhores sonhos um dia ousei desejá-lo, pois pra mim ele era como o amor dos poetas, belo, puro e inatingível.

No entanto não fugi da minha sina em nenhum momento. Bebemos, dançamos, conversamos e rimos a noite toda.



O PRIMEIRO BEIJO



Quase no final do baile percebi que meus amigos haviam cada um arrumado uma garota e sumiram da festa. Comentei com ele que meus amigos tinham me abandonado. E brinquei dizendo a ele:

− Como eu, uma garota “ingênua e desamparada” voltarei sozinha para casa?

E ele respondeu um não sei o quê, que o barulho não me deixou ouvir, então me aproximei dele e perguntei o que havia dito.

Nesse momento os meus olhos encontraram os olhos dele e se perderam nessa troca. Por um instante, pareceu que a terra havia parado e que só existíamos os dois no planeta. E aqueles olhos, tão lindos, foram se fechando, os lábios úmidos se abrindo e tive a impressão que sinos soaram em meus ouvidos, nesse momento o espaço parecia efêmero. E nossos lábios se uniram num beijo tão maravilhoso, doce, arrebatador e especial.

Numa fração de segundos o mágico momento virou a mais magnífica realidade, a música voltou a tocar e muitos outros beijos como aquele vieram.

Depois de muitos beijos arrebatadores percebemos que o baile estava acabando e já restavam poucas pessoas no salão. Então saímos abraçados e ele me levou até minha casa.

Parou a moto em frente ao portão, comentou sobre como sinistro achava o cemitério, beijou-me a boca como despedida e partiu.



NO OUTRO DIA



Acordei cedo, fui até a cozinha, bebi um copo com água, encostei-me à porta, senti uma felicidade e depois uma secura na boca. Uma tristeza misturada com insegurança. Pensei; “foi um sonho, é maravilhoso demais, só pode ter sido sonho.”

Um barulho na sala me fez voltar à realidade, eram os meninos que começavam a acordar e logo começou a reclamação de ressaca e as novidades do baile. E eu só ouvia a tudo e recordava maravilhosa noite de beijos.

─ E você, hein? Não laçou ninguém?

Perguntou-me o Coalhada:

─ Eu... Não!... Fui laçada!

─ Humm! Conta! Conta!!!

─ Fiquei com o Cleber...

A Andréia que ainda estava deitada gritou do quarto:

─ Não acredito. O bonitão da Titan?

─ O próprio. – Confirmei.

─ E ai? Vocês estão namorando?

─Não sei... – suspirei − Acho que não!



ESPERA ANGUSTIANTE



O dia seguinte é terrível para as mulheres, a gente fica numa ansiedade horrível, muitas dúvidas surgem: “se será procurada novamente; se que ele gostou; se foi muito atiradinha para o primeiro encontro”. E várias outras dúvidas passam por nossas cabeças e comigo não foi diferente, pensei tudo isso e muito mais. A espera é angustiante.

Depois do almoço os meninos tiravam uma soneca e depois voltavam para a escola de carona.

A Andréia foi para seu estágio numa fazenda perto de Camapuã.

A Dani viajou pra sua casa, pois começava a semana do saco cheio e não teríamos aula.

Eu começaria meu estágio na suinocultura da escola na segunda feira e ficaria sozinha em casa a semana inteirinha, numa solidão de fazer dó, falei comigo mesmo:

− Sozinha! A casa em frente ao cemitério! Humm! Isso não é nada bom...

Mergulhada em meus pensamentos sentei-me na varanda para tomar um tereré e foi então que eu tive a melhor visão do dia: O Cleber andando pela grama verde, com uma bermuda Jeans, uma camiseta vinho e um largo sorriso no rosto. Até o Zeus se encantou com ele e também ficou admirando seu caminhar e não deu um latido se quer.

Quando chegou bem perto de onde eu estava me levantei para pegar uma cadeira para ele que disse “oi” e me beijou de súbito.

Dizem que o primeiro beijo é o melhor, mas ainda hoje fico em dúvida, não sei se o melhor realmente foi o primeiro ou se foi o segundo que veio acompanhado de um “oi” que rematou minhas dúvidas.